Este artigo é parte de um estudo maior escrito e publicado pela arquiteta Jenny Nascimento, profissional de enorme prestígio aqui na nossa Romero Lab, que trouxe este tema tão importante para refletirmos e agirmos sobre.
Caso queira a leitura completa do artigo, vocês podem me pedir diretamente pelos comentários ou pela página de contato, ou uma DM, caso esteja lendo no Linkedin.
Vamos lá!
SOBRE NEGRITUDE E LUGAR DE FALA:
O que é colorismo? Sou negra ou não? Quem pode falar sobre isso? Pessoas brancas falando sobre arte e história negra é algo que faz sentido??
Um questionamento que recebi de um homem negro ao tratar de um assunto relacionado ao racismo em meu canal do Youtube foi o do quanto minha cor legitima a minha fala.
Este questionamento está relacionado ao “Colorismo” que de acordo com um artigo elaborado pelo Instituto Geledés foi usado pela primeira vez pela escritora Alice Walker no ensaio “If the Present Looks Like the Past, What Does the Future Look Like?”, que foi publicado no livro “In Search of Our Mothers’ Garden” em 1982.
O colorismo ou pigmentocracia é um fenômeno que pode descrever uma gradação do preconceito que atinge mais à pessoas negras de pele mais escura que pessoas negras de pele mais clara.
Por vezes é difícil determinar em um debate, se determinadas características incluem uma pessoa no grupo das pessoas negras ou pardas.
Dito isto, é importante saber fazer uma diferenciação entre cor e raça, uma pessoa pode ser negra, ainda que não apresente todos os traços de uma pessoa de cor preta, retinta.
APAGAMENTO HISTÓRICO – “PROVOCAÇÕES”:
Arquitetas e Arquitetos negros como atores na construção da cidade, arquitetura e produção relacionada – Situações que ilustram o apagamento, dentro e fora do País.
O apagamento que citei, ocorre também na escala da nossa cidade e país, que é recorde em muitas desigualdades e que tem em seu histórico um processo escravocrata longo e desumano.
Por uma questão de escala e proximidade trataremos aqui da cidade de São Paulo que é uma referência de arquitetura e história do urbanismo, muito se fala sobre os casarões da paulista, sobre o barões do café e as edificações históricas construídas sob incentivo financeiro destes, fala-se sobre a influência dos imigrantes Italianos nessas construções e até sobre a influência alemã embora menos presente.
Falamos dos portugueses em igrejas e casas coloniais, dos Japoneses em bairros como a Liberdade, no entanto, à muito pouco, mal se sabia quem era Tebas dentro de um curso universitário de Arquitetura & Urbanismo.
O que tudo isso tem a ver com Racismo?
Inicialmente, acredito ser importante lembrar e reconhecer que o racismo é, sem muitas delongas, o principal responsável pelo cenário descrito nos dados acima e que o mesmo se instaura de maneira estrutural, uma vez que vai sendo construído a partir de equívocos na história, que são carregados de geração para geração, de um povo para o outro.
Também surge do pressuposto de que somos melhores uns que os outros e de um antropocentrismo que evolui para “Antropocentrimo-branco-cis”.
Os processos escravocratas e de tráfico de pessoas também são, com total certeza, um dos principais propulsores de todo um cenário que vitimou a população africana e afrodescendente. Neste momento é possível que nos perguntemos: Porque os negros? Onde essa ideia de superioridade branca começou?
Há de se ouvir que seleção natural justifica tudo isso e que vencem os mais fortes: Como pensava Hitler, por exemplo.
No entanto, cabe uma reflexão do quanto esse princípio em uma sociedade desenvolvida é válido pois se imergimos em questões filosóficas, analisando as falhas desse argumento, veremos que não é possível afirmar que isso é justo.
Podemos fazer uma análise simples, Veja: Parece justo que um adulto mate uma criança? A resposta é, não!
Qual o argumento? Seria covardia pois o mesmo não compreende em sua totalidade a situação e não tem condições de defesa.
A fraqueza ou força dentro de um contexto específico não determina quão melhor ou pior é um grupo. Isso deveria ser óbvio, mas se ainda há preconceito, isso precisa ser dito.
Quero dizer com isso que os povos africanos eram necessariamente mais fracos? Não!
Construíram civilizações, edificações, cultura e ciência foram precursores em muitas coisas se comparado ao mundo ocidental, mas com certeza questões circunstanciais influenciaram e até mesmo questões geográficas e morais.
Podemos ver por exemplo, o histórico da colonização do Brasil, onde parte da população indígena possuía técnicas de defesa mais “rudimentares” que os portugueses e principalmente, valores mais amistosos em relação à seus oponentes, fora isso podemos citar para esse caso, outras questõe, como a desestabilização de muitas tribos em função de doenças trazidas pelo homem branco.
ATUAÇÃO NO MERCADO – PESQUISA x MERCADO
Estratégias de mudança
Um dilema pós-formação, em um cenário tão hostil às pessoas negras, é a escolha entre investir em uma carreira voltada ao mercado ou uma carreira científica, que pode ainda ser relacionada à carreira acadêmica.
Na primeira, falamos de Arquitetos que atuam diretamente com a execução de projetos, acompanhamento de obras, desenhos dos mais variados tipos de espaço, dentre outros, enquanto no segundo caso estão os cientistas da área, pesquisadores e professores.
A atuação no mercado de arquitetura tem a desvantagem do preconceito, que pode ser enxergado através dos dados já apresentados, no entanto pode garantir ainda que a muito custo a ascensão de pessoas negras que lutam contra o preconceito.
A ascensão de pessoas negras em si, já tem seu impacto político!
Atuando no ramo de pesquisa e acadêmico, por sua vez é possível disseminar novas idéias de maneira muito profunda, que podem mudar todo um entendimento da sociedade, o ponto negativo dessa outra opção é que hoje em dia em nosso país, existe bem pouco incentivo à pesquisa e à educação, o incentivo financeiro principalmente, é bastante precário.
Vale ressaltar que a escolha de atuar no mundo acadêmico, não elimina de jeito nenhum a chance de uma pessoa negra sofrer com o racismo e desigualdade racial, o que ocorre é que o ingresso no meio acadêmico pode ser “facilitado” atualmente por iniciativas do poder público, ONGs e mesmo de instituições privadas enquanto a contratação de serviços de arquitetura ainda se concentra nas mãos de uma parcela muito pequena e privilegiada da população, que por vezes, carrega consigo a ignorância e estigmas elitistas e coloniais.
Acredito que essa escolha deva se pautar em um desejo sincero de seguir por um ou outro, aptidão ou algo do gênero, desde que isso ocorra de maneira bem pensada.
Há ainda quem tente equilibrar as duas coisas, o que é claro, tem chances de fazer com que não se possa desenvolver plenamente nem uma coisa nem outra, mas faz parte do processo de amadurecimento de qualquer ser humano, analisar contextos e fazer escolhas, seja esse contexto mais fácil ou mais complexo.
O importante é saber que as pessoas negras podem e devem ocupar esses espaços, que o caminho é tortuoso mas o movimento precisa ser de resistência e não o contrário, pois foi a resiliência de pessoas negras e de outras raças, que garantiram que hoje, possamos viver em um contexto um pouco menos racista que séculos atrás.
Espero que essa leitura tenha levantado bons questionamentos e que possamos agir juntos para transformar essa realidade.